Data: 23/01/2015
"1. Discussão relativa à
necessidade de lavratura de escritura pública para prática de ato de
disposição da meação da viúva em favor dos herdeiros. 2. O ato para
dispor da meação não se equipara à cessão de direitos hereditários,
prevista no art. 1.793 do Código Civil, porque esta pressupõe a condição
de herdeiro para que possa ser efetivada. 3. Embora o art. 1.806 do
Código Civil admita que a renúncia à herança possa ser efetivada por
instrumento público ou termo judicial, a meação não se confunde com a
herança. 4. A renúncia da herança pressupõe a abertura da sucessão e só
pode ser realizada por aqueles que ostentam a condição de herdeiro. 5. O
ato de disposição patrimonial representado pela cessão gratuita da
meação em favor dos herdeiros configura uma verdadeira doação, a qual,
nos termos do art. 541 do Código Civil, far-se-á por Escritura Pública
ou instrumento particular, sendo que, na hipótese, deve ser adotado o
instrumento público, por conta do disposto no art. 108 do Código Civil"
Íntegra do v. acordão:
Íntegra do v. acordão:
Acórdão: Recurso Especial n. 1.196.992 - MS.
Relator: Min. Nandy Andrighi.
Data da decisão: 06.08.2013.
Relator: Min. Nandy Andrighi.
Data da decisão: 06.08.2013.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.196.992 - MS (2010⁄0104911-6)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : MARIA JOSÉ DE SOUZA
ADVOGADO : OLGA LEMOS CARDOSO DE MARCO - DEFENSORA PÚBLICA
INTERES. : BIANOR ALVES PEREIRA - ESPÓLIO
REPR. POR : MARIA GIOVANNA MARANZANA - INVENTARIANTE E OUTRO
INTERES. : JUÍZO DE DIREITO DA 1A VARA CÍVEL DE TRÊS LAGOAS - MS
RECORRENTE : MARIA JOSÉ DE SOUZA
ADVOGADO : OLGA LEMOS CARDOSO DE MARCO - DEFENSORA PÚBLICA
INTERES. : BIANOR ALVES PEREIRA - ESPÓLIO
REPR. POR : MARIA GIOVANNA MARANZANA - INVENTARIANTE E OUTRO
INTERES. : JUÍZO DE DIREITO DA 1A VARA CÍVEL DE TRÊS LAGOAS - MS
EMENTA: SUCESSÕES. RECURSO
ESPECIAL. MEAÇÃO. ATO DE DISPOSIÇÃO EM FAVOR DOS HERDEIROS. DOAÇÃO. ATO
INTER VIVOS. FORMA. ESCRITURA PÚBLICA. 1. Discussão relativa à
necessidade de lavratura de escritura pública para prática de ato de
disposição da meação da viúva em favor dos herdeiros. 2. O ato para
dispor da meação não se equipara à cessão de direitos hereditários,
prevista no art. 1.793 do Código Civil, porque esta pressupõe a condição
de herdeiro para que possa ser efetivada. 3. Embora o art. 1.806 do
Código Civil admita que a renúncia à herança possa ser efetivada por
instrumento público ou termo judicial, a meação não se confunde com a
herança. 4. A renúncia da herança pressupõe a abertura da sucessão e só
pode ser realizada por aqueles que ostentam a condição de herdeiro. 5. O
ato de disposição patrimonial representado pela cessão gratuita da
meação em favor dos herdeiros configura uma verdadeira doação, a qual,
nos termos do art. 541 do Código Civil, far-se-á por Escritura Pública
ou instrumento particular, sendo que, na hipótese, deve ser adotado o
instrumento público, por conta do disposto no art. 108 do Código Civil.
6. Recurso especial desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da TERCEIRA Turma do Superior Tribunal de
Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes
dos autos, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos
termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros
João Otávio de Noronha, Sidnei Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e
Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 06 de agosto de 2013(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora
RECURSO ESPECIAL Nº 1.196.992 - MS (2010⁄0104911-6)
RECORRENTE : MARIA JOSÉ DE SOUZA
ADVOGADO : OLGA LEMOS CARDOSO DE MARCO - DEFENSORA PÚBLICA
INTERES. : BIANOR ALVES PEREIRA - ESPÓLIO
REPR. POR : MARIA GIOVANNA MARANZANA - INVENTARIANTE E OUTRO
INTERES. : JUÍZO DE DIREITO DA 1A VARA CÍVEL DE TRÊS LAGOAS - MS
ADVOGADO : OLGA LEMOS CARDOSO DE MARCO - DEFENSORA PÚBLICA
INTERES. : BIANOR ALVES PEREIRA - ESPÓLIO
REPR. POR : MARIA GIOVANNA MARANZANA - INVENTARIANTE E OUTRO
INTERES. : JUÍZO DE DIREITO DA 1A VARA CÍVEL DE TRÊS LAGOAS - MS
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora):
Cuida-se de Recurso Especial interposto
por MARIA JOSÉ DE SOUZA, com base no art. 105, III, "c", da Constituição
Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de Mato
Grosso do Sul (TJ⁄MS).
Ação: arrolamento sumário dos bens deixados por BIANOR ALVES PEREIRA, em razão de seu falecimento.
Decisão: indeferiu o ato de disposição
da integralidade da meação pela viúva MARIA JOSÉ DE SOUZA, nos autos do
arrolamento, por entender que não se trata de herança, mas de patrimônio
particular da meeira, perfazendo ato não afeto ao juízo sucessório,
sendo, portanto, necessária a lavratura de escritura pública para sua
efetivação.
Acórdão: manteve a decisão unipessoal
que negou provimento ao recurso de agravo de instrumento interposto por
MARIA JOSÉ DE SOUZA, para reafirmar a necessidade de escritura pública
que a viúva disponha da sua meação em favor dos herdeiros, o que não
pode ser feito por termo nos autos doinventário, por se tratar de ato de
disposição patrimonial inter vivos, nos termos da seguinte ementa
(e-STJ fls. 86⁄92):
EMENTA – AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO –
DECISÃO QUE NEGOU SEGUIMENTO DE PLANO AO RECURSO – AGRAVO REGIMENTAL QUE
NENHUM ELEMENTO NOVO TROUXE QUELEVASSE O RELATOR A SE RETRATAR DA
DECISÃO PROLATADA – RECURSO NÃO PROVIDO.
Mantém-se a decisão que nega seguimento
de plano, se no agravo regimental o recorrente nenhum elemento novo
trouxe, que pudesse levar o relator a se retratar da decisão prolatada.
Recurso especial: interposto por MARIA
JOSÉ DE SOUZA com base na alínea "c" do permissivo constitucional (e-STJ
fls. 97⁄105), alega a existência de dissídio jurisprudencial entre o
acórdão recorrido e o acórdão proferido pelo TJ⁄SP, no agravo de
instrumento n.º 468.409-4⁄5-00, em sede do qual teria sido reconhecida a
possibilidade de renúncia à meação por termo dos autos, não se fazendo
necessária a lavratura de escritura pública perante o Tabelião.
Exame de admissibilidade: o recurso foi admitido na origem pelo TJ⁄MS (e-STJ fls. 118⁄120).
É o relatório.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.196.992 - MS (2010⁄0104911-6)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : MARIA JOSÉ DE SOUZA
ADVOGADO : OLGA LEMOS CARDOSO DE MARCO - DEFENSORA PÚBLICA
INTERES. : BIANOR ALVES PEREIRA - ESPÓLIO
REPR. POR : MARIA GIOVANNA MARANZANA - INVENTARIANTE E OUTRO
INTERES. : JUÍZO DE DIREITO DA 1A VARA CÍVEL DE TRÊS LAGOAS - MS
RECORRENTE : MARIA JOSÉ DE SOUZA
ADVOGADO : OLGA LEMOS CARDOSO DE MARCO - DEFENSORA PÚBLICA
INTERES. : BIANOR ALVES PEREIRA - ESPÓLIO
REPR. POR : MARIA GIOVANNA MARANZANA - INVENTARIANTE E OUTRO
INTERES. : JUÍZO DE DIREITO DA 1A VARA CÍVEL DE TRÊS LAGOAS - MS
VOTO
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora):
Cinge-se a controvérsia a analisar a
possibilidade da viúva renunciar sua meação em favor dos herdeiros, por
termo nos autos de inventário, dispensando-se a lavratura de escritura
pública.
I – Das formalidades relacionadas ao ato de disposição da meação do cônjuge em favor dos herdeiros.
O acórdão recorrido afirma a necessidade
de escritura pública porque a "disposição da meação do cônjuge
supérstite é ato de iniciativa inter vivos e não se confunde com a
sucessão causa mortis. Ademais, a escritura pública é a forma prescrita
pela lei como condição essencial para validade de alguns atos, e
paratais, torna-se ele imprescindível, nos termos do art. 108 do CC"
(e-STJ fl. 90).
Aduz a recorrente, todavia, que não tem
condições de arcar com o pagamento dos emolumentos cartorários
necessários à lavratura de instrumento público para dispor da meação em
favor dos herdeiros, e que há jurisprudência do TJ⁄SP admitindo a cessão
da meação por termo judicial nos autos do inventário.
O acórdão paradigma apontado pela
recorrente, de fato, reconheceu a possibilidade da cessão da meação se
dar por termo nos autos, ao equipará-la, de certa maneira, à renúncia da
herança.
Para corroborar sua conclusão, o TJ⁄SP
faz remissão à lição de Euclides Benedito de Oliveira e Sebastião Luiz
Amorim, no sentido de que "embora inconfundível com a renúncia à
herança, dela se aproxima ao ponto em que implica efetiva cessão de
direitos, de modo que utilizáveis os mesmo instrumentos para sua
formalização. Com efeito, o direito de cada herdeiro, a título de posse
ou propriedade, sobre sua parte ideal na herança, antes da partilha é
juridicamente equivalente ao do cônjuge sobrevivo sobre a metade ideal
dopatrimônio a partilhar" (Inventários e Partilhas – Direito das
Sucessões, 16ªed., Leud: São Paulo, 2003, p. 64⁄65) (e-STJ fl. 19) (sem
destaque no original).
Embora o art. 1.806 do Código Civil, de
fato, admita que a renúncia à herança possa ser efetivada por
instrumento público ou termo judicial, é relevante apontar uma sensível
diferença entre os institutos: enquanto na herança, a posse ou
propriedade dos bens do de cujus transmite-se aos herdeiros quando e
porque aberta a sucessão (princípio do saisine), na meação, o patrimônio
é de propriedade da viúva em decorrência do regime de bens do
casamento, independe da abertura da sucessão, e pode ser objeto de ato
de disposição pela viúva a qualquer tempo, seja em favor dos herdeiros
ou de terceiros.
Em síntese, a renúncia da herança
pressupõe a abertura da sucessão e a condição de herdeiro, situações que
não se aplicam à viúva-meeira. Nas palavras de Francisco José Cahali e
Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka:
Representando abdicação do direito à
herança, só se admite a renúncia quando da abertura da sucessão,
oportunidade em que nasce o direito hereditário. O repúdio prematuro, ou
promessa de renúncia, ainda que formal, promovidos antes do
falecimento, não tem validade jurídica, até porque implicariam em ilegal
pacto sucessório" (Direito das Sucessões, 4ªed., São Paulo: RT, 2012,
p. 89).
Assim, na hipótese, o ato de disposição
patrimonial da recorrente, caracterizado como a renúncia da sua meação
em favor dos herdeiros, não pode ser equiparada renúncia da herança.
Da mesma forma, ele não se confunde com a
cessão de direitos hereditários, prevista no art. 1.793 do Código
Civil, porque esta também pressupõe a condição de herdeiro do cedente.
Note-se, por oportuno, que a própria cessão de direitos hereditários
exige a lavratura de escritura pública para sua efetivação, não havendo
porque se prescindir dessa formalidade no que tange à cessão da meação.
Com efeito, verifica-se que ato de
disposição patrimonial pretendido pela recorrente, representado pela
cessão gratuita da sua meação em favor dos herdeiros do falecido,
configura uma verdadeira doação, inclusive para fins tributários, como,
aliás, já foi consignado por esta Corte, no Ag 1165370, Rel. Min. Luiz
Fux, DJe de 18.09.2009.
E a doação, por sua vez, nos termos do
art. 541 do Código Civil, far-se-á por Escritura Pública ou instrumento
particular, sendo que, na hipótese, deve ser adotado o instrumento
público, por conta do disposto no art. 108 do Código Civil.
Embora seja compreensível a dificuldade
da recorrente em arcar com o pagamento dos custos necessários à
lavratura de uma escritura pública, perante o Tabelião, para poder
transferir aos seus filhos a propriedade da metade do imóvel
inventariado, que lhe pertence em razão da meação, não há possibilidade
de se prescindir das formalidades expressamente previstas na legislação
civil.
Forte nestas razões, NEGO PROVIMENTO ao recurso especial.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA
Número Registro: 2010⁄0104911-6
PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.196.992 ⁄ MS
PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.196.992 ⁄ MS
Números Origem: 20090280306 20090280306000100 20090280306000101 21090051530
PAUTA: 06⁄08⁄2013 JULGADO: 06⁄08⁄2013
Relatora
Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. JOSÉ BONIFÁCIO BORGES DE ANDRADA
Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : MARIA JOSÉ DE SOUZA
ADVOGADO : OLGA LEMOS CARDOSO DE MARCO - DEFENSORA PÚBLICA
INTERES. : BIANOR ALVES PEREIRA - ESPÓLIO
REPR. POR : MARIA GIOVANNA MARANZANA - INVENTARIANTE E OUTRO
INTERES. : JUÍZO DE DIREITO DA 1A VARA CÍVEL DE TRÊS LAGOAS - MS
ADVOGADO : OLGA LEMOS CARDOSO DE MARCO - DEFENSORA PÚBLICA
INTERES. : BIANOR ALVES PEREIRA - ESPÓLIO
REPR. POR : MARIA GIOVANNA MARANZANA - INVENTARIANTE E OUTRO
INTERES. : JUÍZO DE DIREITO DA 1A VARA CÍVEL DE TRÊS LAGOAS - MS
ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Sucessões - Inventário e Partilha
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA,
ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data,
proferiu a seguinte decisão:
A Turma, por unanimidade, negou
provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a).
Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Sidnei
Beneti, Paulo de TarsoSanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram
com a Sra. Ministra Relatora.